sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Quanto vale uma prata?

Estava a ponto de vender o seu bem mais precioso. Tinha 35 anos e há 30 que guardava as pratas dos chocolates. Naquela valiosa bola, feita de lixo, estavam impressos quilómetros e quilómetros de estradas, passeios, corredores. Impressões digitais seriam às centenas. Quantas vezes a comparara com as dos seus amigos? Quantas vezes a tinham pesado usando apenas as mãos? Nem sabia dizer.

Mas chegara a hora de se desfazer dela. Não tinha outra hipótese. As dívidas acumulavam-se, os preços aumentavam, o salário diminuía. Tinha mesmo de ser. Entrou na ourivesaria. Estava cheia de pessoas a tentarem vender o seu ouro. Nenhuma delas tinha uma bola de prata como a sua. Esperou pela sua vez.

Foi atendido quase uma hora depois. No balcão acumulavam-se quilates e quilates de ouro. A prata era inexistente. Mostrou a sua preciosidade ao dono da loja.

- Quanto me dá por esta bola de prata maciça?, perguntou, num misto já generalizado de esperança e desalento.

- Mas o senhor está a brincar comigo? Como se atreve a gozar com a cara das pessoas que passam dificuldades? Ponha-se na rua ou chamo a segurança! - ameaçou, com intenções de passar das palavras aos actos.

Saiu da ourivesaria, envergonhado. Aquele era o seu último recurso. Sentia que a lama que, até ali, apenas lhe chegava ao pescoço começava a invadir a boca e as narinas. Aquela era mesmo a sua última esperança. Durante horas calcorreou as ruas da cidade sem rumo.

Que iria fazer agora? Sentou-se no passeio, absorto nos pensamentos. Despertou para a realidade com uma pequena bola de prata a tocar-lhe nos pés. Pegou nela, com vontade de a destruir. Não passava de lixo. Apenas e só lixo. Para a sociedade não valia um cêntimo. Não foi capaz. Viu um pequeno vulto a correr em direcção a si.

- Senhor! Senhor! Obrigado! Muito obrigado! Estão aí todos os chocolates dos meus últimos 3 meses. Ainda agora comprei outro... Quero mostrar aos meus amigos como a minha bola é maior que a deles.

Os olhos brilhavam. O sorriso era puro. A alegria infantil. Pela primeira vez na vida, teve uma uma revelação - podia não ter dinheiro, a bola podia não valer nada para os outros, mas, para si, significava tudo.

3 comentários:

Alpista descendente disse...

Uma ideia deliciosa como o chocolate e as suas pratas. Muito criativa nini, gostei imenso!

Anónimo disse...

Mesmo giro. Estou agora a imaginar as pessoas a andar com bolas de prata pelo Rossio XD

Inês disse...

lolol, isso também é criatividade nonó. Mas dava uma grande foto, lá isso dava.